v. 57 n. 226 (1997): Jesus, obstáculo ao diálogo?
Parafraseando o dito de Jesus sobre o escriba instruído nas coisas de Deus, poder-se-ia dizer que todo cristão que ouve a voz do Espírito Santo é como uma mãe ou um pai de família que retira do tesouro de sua experiência e criatividade coisas novas e velhas. O que queremos dizer com isso? Queremos aludir ao fenômeno da “leitura” do mistério de Deus. Toda pessoa humana - segundo sua cultura pessoal, segundo a cultura ambiente e ainda segundo o estágio em que esta cultura se encontra - tem um modo próprio de compreender a vida. Deste modo manifesta-se uma extrema variedade de percepções do mistério de Deus que, à primeira vista, pode parecer um caos. No entanto, a partir da ob-audiência (obediência) ou da contemplação ou de um sábio agir, trata-se de manifestações de uma mesma unidade, de um mesmo e inefável mistério. Para os cristãos este Inefável, senhor da História, se tornou e se torna Palavra, se re-velou e se re-vela em Jesus Cristo. Então, o desafio para uma convivência pacífica da família humana consiste em encontrar caminhos de entendimento e comunhão entre as diferentes identidades religioso-culturais. Mário de França Miranda - neste ano de 97, o primeiro na pedagogia litúrgica rumo ao terceiro milênio, em que se destaca a pessoa de Jesus Cristo - nos brinda com um excelente ensaio justamente sobre Jesus Cristo, luz das culturas. Para além do pluralismo cristão, o Autor busca, sem concordismos, caminhos de comunhão inter-religiosa, o que nos faz lembrar a iniciativa de João Paulo II, em 1986, de promover em Assis a Jornada Mundial de Oração pela Paz. Em outras palavras e sem fundamentalismo ou triunfalismo, trata-se de entender e atualizar com honestidade a catolicidade da Igreja, uma vez que o Espírito sopra onde, quando e como quer.
Duas pertinentes colocações sobre economia, ética e teologia nos põem ao par dos atuais desafios da humanidade e, particularmente, dos cristãos. A linguagem da economia nos coloca em contato com as condições da sobrevivência: alimento, casa, vestuário, corpo, dinheiro, trabalho; nos fala da experiência de abundância e acúmulo, de limitações e carências: nos fala de sonhos e desilusões, de vida e de morte, de amor e de ódio. de endeusamentos e de exclusões. O esforço para “organizar” e dominar a terra com felicidade significa estabelecer gradualidade de valores, como, p. ex.: todos os bens estão a serviço da pessoa humana e não o contrário; por sua vez, a pessoa está para o Deus verdadeiro, não em função de falsos deuses. A Hugo Assniann e Jung Mo Sung agradecemos a partilha da leitura crítica de nossa realidade econômica a partir do ocular ético e da fé.
Entre as ciências humanas, hoje em dia destaca-se ainda a biologia. A aplicação de suas descobertas no reino vegetal, animal e até humano são óbvias e prometem ser maiores. Diante das possibilidades da manipulação genética e de suas inerentes implicações éticas, levantam-se esperanças e perplexidades. Estas esperanças e perplexidades evocam o tom dos profetas que anunciam boas notícias e denunciam desmandos. Confira o ensaio de Hubert Lepargneur que acompanha os avanços das ciências biológicas com o amor, a esperança e o carinho de quem sonha em promover ou mesmo em salvaguardar a vida.
Do discernimento cristão em relação às ciências econômicas e biológicas, passamos à consideração de outra dimensão, própria dos discípulos de Jesus: a do envio para evangelizar. Talvez nos ocorra a pergunta: “a quem evangelizar?” Leia então o que Jaldemir Vitorio relata sobre esta problemática em Mateus, e como ele identifica os destinatários do Kerygma.
Finalmente, Você pode dispor de uma síntese entre a função pessoal e social da propriedade privada e o ensino social da Igreja, feita por Luigi Perugini. O assunto é re-tirado do tesouro no momento em que no Brasil vem à tona um dos desafios mais graves de nossa história: a partilha da terra.
Elói Dionísio Piva, OFM
Redator